Há quem pense que vivo tranquilamente em minha casa, com uma mulher que me adora, um filho já de dez anos e uma bebé recém-nascida. É falso. Desde que me atribuiram mais horas de trabalho, a mim que já me via em dificuldades com duas direcções de turma, a escola passou a ser a minha verdadeira casa, todo o meu mundo, o meu universo inteiro. Se continuo a falar da mulher, de um filho que não tenho tempo para saber que caminhos trilha (o seu ídolo já não sou eu: é um arrumador de um parque de estacionamento do PINGO DOCE) ou de uma filha que não verei crescer, é para manter uma fachada: são elementos de uma vaga e pretensa identidade secreta. Na verdade, eu sou, na minha escola, neste mundo em que caí, um super-herói, e o ponto é que os super-heróis precisam de identidades secretas. Sim, amigos. Greenlight - sou eu!
Quando me vêem atravessar a passadeira em direcção ao portão da escola, com uns óculos muito espesos, uma nariganga que o colega-caricaturista-de-serviço não perdoa, os pés para o lado, à pato, os sapatos desatados, uma pasta velha, a abarrotar, não se deixem enganar. É o meu disfarce. Sob a roupa desta personagem, misto de Clark Kent e de Peter Parker, esconde-se um uniforme muito justo, com collants e slip - não, não é roupa interior suspeita, bolas!, é, repito, o meu uniforme - e uma capa que tenho alguma dificuldade em amarfanhar e enfiar por dentro da camisa. É um uniforme luminosamente verde. Não por causa do meu querido Sporting. Muito menos vejam nesta cor o verde-esperança: trata-se do verde-náusea, o verde-enjoo - porque a vida do português é dura e a de professor português é de se vomitar. Os super-heróis pós-modernos já não pensam mudar o mundo, só em não o deixar cair tão fundo. A heroicidade resume-se a espernear até que alguém dê por alguma coisa. Os professores heróis dos nossos dias combatem um sofisticadíssimo sindicato do crime - vulgo, ministério - embora sabendo que há inimigos coriáceos, que regressarão sempre, mesmo com outras personalidades e sob outros nomes, e que não serão definitivamente derrotados: Lex Luthor, Doctor Octopus, Ginger Ale, Lurdes Rodrigues...
Reivindico, ao menos, para a escola, uma cabina teleónica. Quero ser um herói à maneira antiga, um clássico e, portanto, é nas cabinas telefónicas que me mudo quando oiço gritar por socorro. Fazê-lo ali no átrio, ao lado do telefone público da escola, sem cabina, à vista de todos, é pôr em risco a minha identidade secreta. Se calhar é por isso que, quando me vêem passar, as pessoas sussurram: «Lá vai o tal exibicionista da lingerie verde...!» Eles sabem lá o que é isto: pertencer a um departamento em permanente reunião + arcar com duas direcções de turma + receber encarregados de educação literalmente à noite + ler a revista do sindicato dos professores + ver os anúncios da Pró-Ordem + planificar, leccionar, corrigir...! Eles sabem lá o que é ser um super-herói!
Quando me vêem atravessar a passadeira em direcção ao portão da escola, com uns óculos muito espesos, uma nariganga que o colega-caricaturista-de-serviço não perdoa, os pés para o lado, à pato, os sapatos desatados, uma pasta velha, a abarrotar, não se deixem enganar. É o meu disfarce. Sob a roupa desta personagem, misto de Clark Kent e de Peter Parker, esconde-se um uniforme muito justo, com collants e slip - não, não é roupa interior suspeita, bolas!, é, repito, o meu uniforme - e uma capa que tenho alguma dificuldade em amarfanhar e enfiar por dentro da camisa. É um uniforme luminosamente verde. Não por causa do meu querido Sporting. Muito menos vejam nesta cor o verde-esperança: trata-se do verde-náusea, o verde-enjoo - porque a vida do português é dura e a de professor português é de se vomitar. Os super-heróis pós-modernos já não pensam mudar o mundo, só em não o deixar cair tão fundo. A heroicidade resume-se a espernear até que alguém dê por alguma coisa. Os professores heróis dos nossos dias combatem um sofisticadíssimo sindicato do crime - vulgo, ministério - embora sabendo que há inimigos coriáceos, que regressarão sempre, mesmo com outras personalidades e sob outros nomes, e que não serão definitivamente derrotados: Lex Luthor, Doctor Octopus, Ginger Ale, Lurdes Rodrigues...
Reivindico, ao menos, para a escola, uma cabina teleónica. Quero ser um herói à maneira antiga, um clássico e, portanto, é nas cabinas telefónicas que me mudo quando oiço gritar por socorro. Fazê-lo ali no átrio, ao lado do telefone público da escola, sem cabina, à vista de todos, é pôr em risco a minha identidade secreta. Se calhar é por isso que, quando me vêem passar, as pessoas sussurram: «Lá vai o tal exibicionista da lingerie verde...!» Eles sabem lá o que é isto: pertencer a um departamento em permanente reunião + arcar com duas direcções de turma + receber encarregados de educação literalmente à noite + ler a revista do sindicato dos professores + ver os anúncios da Pró-Ordem + planificar, leccionar, corrigir...! Eles sabem lá o que é ser um super-herói!
6 comentários:
se a vida de professor português é um vómito, imagine-se a vida de um professor de português!É pior, é engolir o próprio vómito... verde (não, não é o Cesário)...verde escarro, verde bilioso, verde green... Aceitam-se outras sugestões de tons de verde.
hoje eu própria despi a minha lingerie amarela e preta e vesti uma very bright red light!!!ena, ena, era para ver se animava um bocado mas não deu resultado,só mesmo as crónicas do Sintoma para animar as hostes!
sugestão para outro verde:verde cócó de bébé...não? esta não era para dizer...?parece mal?
ah!e continuo a não saber entrar, nem por bonecos,snif, snif...
...ó abelhinha... e se fosses fazer um bocado de mel para dar ao pessoal...é só amargura, M:E:, ministra, aulas de substituição...irra que já cansa...
dá-nos mel senão chamo o zangão...
...greenlight...que ridículo...isso não existe... em Amsterdão ainda há o RED LIGHT district...toma lá, ó sindroma!!!
uma identidade secreta fica sempre bem....talvez pegue a moda e se dispam os preconceitos ...deixando ficar a nu os verdadeiros mortais....e daí talvez prefira os disfarces
Enviar um comentário