24 março 2006

DRA. RUTH ACODE AOS TRAUMATIZADOS DA THROMBONE

Aquando da I Grande Guerra, sob o efeito trágico dos gases (não só porque as condições da guerra provocariam alguma flatulência, mas porque se inventaram e se experimentavam novas formas químicas para tentar vencer os inimigos), vários soldados regressavam a casa de olhos perdidos no infinito, rostos fixos, gestos lentos, incapazes de reunir duas ideias, como alguns alunos (e até alguns professores) da eslav: eram os «esgaseados».

Sucede que, neste momento, assistimos, sob o efeito pernicioso de uma coluna do blogue (O Xique e o Xoque), a uma série de homens que me chegam ao consultório num estado semelhante: alguns, mal tentam explicar-me o seu tormento, principiam logo a chorar e já não param. Eu própria acabo a chorar com eles, trocando de lenços, dando palmadinhas mútuas nos ombros. Outros têm o mesmo olhar errante, mostram a mesma depressão mórbida. De modo que resolvi hoje responder a várias cartinhas destes novos esgaseados - os trombonados.

Passemos, de imediato, ao primeiro trombonado:

«Querida Dra. Ruth:

«A vela que arde lentamente, preocupa-me do ponto de vista filosófico: à medida que vai mudando de forma, que se derrete, pergunto-me - Será ainda a mesma vela, agora que se metamorfoseou? Será que há tantas velas quantas formas ela vai plasticamente tomando? Será que, se filosofo de mais e me distraio, ela pode pegar fogo aos meus papéis? Será que ainda leva muito tempo a derreter? Haverá alguma possibilidade de eu próprio derreter primeiro do que a vela?»
René Descartes, Princípios de uma Filosofia à Luz da Vela, Ed. Incroyable Pochette, Paris

Esta citação, Dra., diz tudo o que eu não seria capaz de dizer, mesmo que não tenha nada que ver com o assunto que aqui me traz e mesmo que o meu problema, de facto, seja outro. Mas não faz mal, porque queria arranjar uma citação de Descartes, e esta foi a única que consegui encontrar. Serve.
Vamos agora ao que interessa.
O meu problema tem nome: Paula Thrombone. A senhora leu o que ela escreveu, na semana passada, acerca dos homens da escola? Essa fútil, que só liga às aparências, ao exterior...? Eu, pelo contrário, só me preocupo com a essência: o interior. E posso assegurar-lhe, Dra. Ruth, que toda a minha roupa interior, das peúgas à camiseta, passando pelas boxers, é Hugo Boss. Ora, viu?, nem uma única referência da senhora Thrombone à minha interioridade, às peúgas a condizer com a camiseta...! Só me apetece chorar!
Ass: Planeta-outrora-azul-e-hoje-cinzento-de-tristeza»

Caro Planeta: Então, chore. Tive prazer em poder ajudá-lo.


Passemos a outra carta:

«Querida Dra. Ruth:
O panorama é este:
Há uma pessoa que, sabendo perfeitamente quem é, não deixa que os outros o saibam, e não sabendo quem sou eu não quer saber se eu sei ou se não sei que os outros não sabem que eu não sou ela. O pior é que essa pessoa ofende meio mundo. E deixa que os outros pensem que sou eu que os ofende. Como? Não dizendo que não sou eu que os ofende. Todos pensam que quando ela os ofende sou eu mesma quem ofende os que pensam que ela os ofende porque pensam que ela sou eu. Tudo isto me perturba. Já não sei que pensar: será, Dra., que sou realmente eu a Paula Thrombone???
Ass.: Anônima»

Querida Anônima:
Acontece que eu não sei quem é a Thrombone nem sei quem é a menina. Como quer que lhe responda? Tive gosto em poder ajudá-la.

E, por hoje, uma última:

«Querida Dra. Ruth:
Neste último Xique e Xoque, que acabo de ler, ainda mal refeito da surpresa e cheio de raiva, a senhora Thrombone refere-se, sem papas na língua, ao meu apêndice nasal, que era um problema que eu vinha tentando esconder. Se não me ofendi com o anterior artigo desta falsa fina, indigno-me agora. Começo a ganhar complexos de inferioridade. Pode ajudar-me?

Ass.: Paxhêku»

Caro Paxhêku:
1. Desengane-se: não é possível esconder o seu apêndice nasal.
2. Um apêndice dessa envergadura nunca deveria provocar complexos de inferioridade: uma coisa tão descomunal só pode provocar complexos de superioridade.
Tenho sempre gosto em poder ajudar.

Vão escrevendo, que, se tiver tempo, responderei: gosto muito de ajudar.

Vossa,
Ruth.

1 comentário:

Anónimo disse...

Gostei dessa! Quais complexos e inferioridade, só se for de superioridade?!...