Marius Souselas acordou no meio duma vasta vegetação luxuriante; sobressaltado, olhou à sua volta - só via plantas, flores lindíssimas, árvores frondosas carregadinhas de laranjas. Levou a mão à cabeça, que lhe doía fortemente e detectou um galo. "Onde estou?", pensava enquanto se erguia lentamente e a custo. As imagens que lhe assaltavam a mente sucediam-se em catadupas e baralhavam-no. Os rostos dos alunos que não conseguia apagar da memória, os seus gritos e resmungos mal humurados deixavam-no ainda mais prostrado e um turbilhão de ideias assaltava-o. Queria ficar ali mais tempo, queria não ter que voltar a ouvir "que seca de trabalho", queria desistir de ensinar, queria deixar para trás aquilo que sempre foi o que mais gostou de fazer.
"Já não tenho idade nem estatuto pra estas desordens, vou ter que saír daqui e falar com alguém que ponha ordem nisto". Com esforço, levou a mão ao corrimão azul que lhe parecia ter quilómetros de comprimento, olhou para cima e assustou-se: uma multidão de tartarugas olhava-o fixamente. "Nem aqui me deixam em paz".
Ao longe conseguia ouvir um ruído grave e ritmado, "o motor do ultraleve", pensou. "Os outros devem ter sobrevivido, tenho que procurá-los". A distância e o lusco-fusco não o deixavam perceber que o ruído que ouvia era a máquina de fotocópias que expelia provas globais a um ritmo alucinante.
Não muito longe dali, jazia inanimada Mada Branquinho. Tinha sido violentamente projectada no plano horizontal de projecção e não dava conta de si. À sua volta, num raio de cerca de 15 metros, podiam ver-se espalhadas muitas folhas A3, prenchidas com péssimos rabiscos e salpicadas de combinações cromáticas horríveis pintadas com instrumentos não identificáveis. O sol já tinha ondulado as folhas e algumas começavam a afastar-se.
Joãozinho Hiperactivo parecia ter tido melhor sorte. Perfeitamente lúcido, olhava à sua volta e tentava reconstruir o local. Não conseguia soletrar o que dizia um pequeno quadro que estava pendurado na árvore onde se mantinha encostado, e que lhe era familiar. Sentia terríveis dores nos joelhos mas "pelo menos estou inteiro", pensava ao perceber o que tinha acontecido a si e aos seus companheiros de viagem. "Parece que vim parar a solo amigo".
Mas isso era o que ele pensava.
(CONTINUA)
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