11 março 2007

CARTA ABERTA DE UM ENCARREGADO DE EDUCAÇÃO À SENHORA DONA MINISTRA

Ex. ma senhora dona ministra da Educação:

Sou um homem legal, nos dois sentidos da palavra: sou «légal», como diriam os brasileiros, porque as pessoas em geral me apreciam, canto o fado à desgarrada, animo as almoçaradas e jantaradas de amigos, mascaro-me de Pai Natal para surpreender o meu filho, e faço-o com tanta eficácia que, aos dezassete anos, o garoto ainda acredita que os presentes lhe chegam de trenó; mas sou legal também no sentido em que me considero um cidadão exemplar, que age sempre dentro da mais estrita legalidade: pago impostos, embora aldrabe um poucochinho as contas (aliás, em Portugal talvez não fosse légal nem legal não o fazer); nunca me atraso à hora de sair do emprego; e, à entrada, o ponto é picado escrupulosamente - quando sei que não poderei estar lá à porta às nove horas da manhã, não me esqueço de passar antecipadamente o cartão a um colega, para que o pique ele por mim; nunca fui, sequer, multado: nunca passei por um radar em excesso de velocidade. Eu é que parece que tenho um radar: se há radares por perto, se há polícias por ali, dá-me o cheiro, e porto-me com todo o juízo...

Mas, senhora ministra, não lhe quero fazer perder tempo. Venho é lembrar-lhe que se deve procurar legislar de acordo com aquilo que já é a prática da maioria dos cidadãos no país. A lei deve ir ao encontro dos costumes: deve ser uma expressão do comportamento que uma sociedade tem por normal. Nessa medida, gostaria de lhe propor que se legislasse no sentido de os pais poderem bater nos professores. O contrário, seria ir contra uma tradição, contra um hábito arreigado, contra um costume tido por normal, pelos vistos, pela maioria dos Encarregados de Educação. Já todos sabemos que os professores estariam contra, mas alguém os leva a sério? Alguém lhes liga alguma? Pensando melhor, no meio da pressão que o Ministério tem exercido sobre eles, e muito bem!, talvez nem dessem por isso, ou achassem normal.

Eu ando com umas ganas a um professor da escola do meu filho, minha senhora, que quando o vejo até cego. É professor de Educação Visual. Mas educação, não tem ele nenhuma, e o visual, depois do correctivo que gostaria de lhe aplicar, não vai ficar grande coisa. Não é que ele discrimina alguns alunos da turma, ainda por cima sempre os mesmos, entre os quais o meu filho? Que os interrompe, quando estão a falar para o lado, que os interrompe quando estão a lutar para resolverem os seus problemas, que os interrompe quando estão a falar ao telemóvel?

Eu vou esperar, senhora ministra. Como sou um cidadão légal e legal, só darei a merecida carga de porrada ao professor quando a senhora dona Lurdes legislar nesse sentido. Assim como assim, senhora ministra, é só o que falta.

Muito obrigado pela sua atenção.

José Pardestalos, Encarregado de Educação

4 comentários:

Anónimo disse...

Assim é que é falar, Pardestalos! Tens aqui uma parceira para te acompanhar na carga de porrada aos lingrinhas SM! Vamo-nos a eles, meu!!!

Abelha Maia disse...

eu tb kero ir,eu tb kero ir!!!!!!

Anónimo disse...

Então, meus irmãos?! E o diálogo?
Não sabem que uma palavra bem dada, vale mais que mil taponas?!...

Anónimo disse...

Caro Pardestalos: Cabe-me a mim o papel de compreender o professor que se arrisca a levar um par de estalos. Finalmente entendo porque é que os meus alunos utilizam as réguas como espadas, esquadros como pistolas, borrachas feitas em fanicos como mísseis e compassos como pioneses. A culpa é toda sua. Já agora, convido-o a assistir a uma sessão de luta e não se preocupe com o horário: qualquer primeira meia hora de uma qualquer aula de educação visual de sétimo ano tem a porta aberta à sua presença. Desde que prometa que mantém as mãos nos bolsos.