29 janeiro 2011

QUERIAM O QUÊ? UMA CONTA DA PANDORA?

Luci-Lima estava a perder as estribeiras. Tinha um duplo pai sentado à mesa redonda ia para duas horas e não sabia como ver-se livre dele. O pai, que era ao mesmo tempo pai de um filho e pai de santo voltava sempre a um assunto que ela sabia de cor porque repetia tudo o que de véspera lhe tinha dito ao telefone. O pai era insistentemente chato mas tinha uma voz maviosa; apenas por isso ela ainda não tinha dado um murro na mesa.
À beira de um ataque de nervos estava o gato Zorbas que, curioso como qualquer gato vivo, corria a cada cinco minutos por cima de tudo o que era cadeira, mesa e instrumento musical para a portaria, vulgo pbx, para ser o primeiro a receber o presente. Não estava ninguém, havia sido alarme falso. De cauda descaída e bigodes murchos, retornou ao seu recanto, repetindo "Ai valha-me um burro!"...
Indiferente a tudo isto, O Presidente adicionava uns pontitos ao regimento da CCAD; hesitava entre o ponto final e o ponto de exclamação, agora em desuso, meneando a cabeça ora para a esquerda ora para a direita a ver qual ficava melhor. Madame queixava-se à Pascoela da dor da cabeça que o voltear de Luci-Lima e de Zorbas lhe provocava, muito pior que qualquer arrombar de cacifo.
O sonho começou a desabar quando dona Frita entrou com a informação: estava o desejado senhor com uma pasta, no pbx, para fazer a entrega de um presente.
Na escola bebia-se muita gasosa, iria haver uma recompensa pelos extraordinários lucros; havia uma oferta para cada membro da direcção. Os nervos estavam à flor da pele, Zorbas rasgava as caixas com os dentes, Luci-Lima tomava um calmante...

Cada elemento recebeu uma tampinha de plástico verde com um fido-dido em cima...

21 janeiro 2011

OS CORTES

Se ao menos nos deixassem escolher o tipo de corte... Eu optaria por uma franjinha para usar bandolete.

20 janeiro 2011

AI SE ELE CAI

Este tu cá tu lá de conversa fiada já me está a tirar do sério.
Já não basta escreverem pouco e ainda vêm para aqui com choraminguices e desgostos de amor, narizes, saldos e o diabo a quatro. Minhas senhoras, lamentem-se por causas justas.
Têm falta delas? Eu dou-vos um: consultem o vosso email e vejam uma certa mensagem que vem dum senhor que se chama Vencimentos.
Esse senhor que não usa nome próprio e que apenas revela o apelido anda a ir-nos aos bolsos. Para já, deve ser um gajo poderoso porque tem acesso aos dados das pessoas. Segundo porque nos gamou uma maquia considerável neste mês. O inacreditável é que ninguém reclama. Isto revolta-me.
Uma vez, estava eu na recruta, saiu uma ordem para reduzir a ração de combate. Eu, o Tira-linhas e o Teixeira armamos um pé-de-vento que ninguém conseguiu dormir naquele acampamento. Fomos à cozinha roubar umas panelas e batemos neles toda a noite com uns maços. No outro dia, o rancho foi melhorado. Isso eram outros tempos, quando as pessoas tinham sangue na guelra. Agora a carne é fraca. Fazem-nos trinta por uma linha e todos se calam. E depois vêm queixar-se que não podem ir aos saldos.
Penso que esta Doutora Ruth devia sugerir temas em vez de dar livre arbítrio às suas leitoras. Não me leve a mal. Vejo que continua inspirada e sedutoramente opinativa mas eu no seu lugar não alimentaria estes comentários algo desabridos ao nariz duma pessoa polida e discreta que até tem feito furor entre o mulherio da escola. Na escola sempre houve homens que tiveram as mulheres a seus pés. Ele não é o primeiro nem o último, lhe garanto, a fazê-las tombar. Admiro-o por isso.

19 janeiro 2011

CARA RUTH

Cara Dra. Ruth

Escrevo-lhe para, por um lado manifestar a minha concordância e admiração pelos seus conselhos, por outro lado acrescentar algo à visão sobre a actual conjuctura.
Considero que o seu conselho à anónima brasileira é magistral - não precisamos de concorrência desleal em tempo de crise - "desista!", disse. Não precisamos de brasileiras bronzeadas (com sol todo ano), com bens de primeira necessidade feminina (manicure, massagens, estética...) ao preço da chuva(reáis).
Por outro lado (e sujacente à 1ª razão)considero que a crise generalizada de homens disponíveis sente-se à escala nacional: no meu serviço passa-se o mesmo!...
Porém, permita-me discordar, perante uma procura maior do que a oferta defendo o princípio da rotatividade. Passo a explicar: em tempo de crise as dificuldades devem ser distribuídas por todos/todas. Se um cavalheiro, bem parecido e gentil, é solicitado por várias damas, não devemos alimentar a sua indecisão, mas levá-lo a desfrutar, à vez, as diferentes possibilidades. Todas/todos usufruirão das vantagens, sem daí colher inconvenientes.
Também não sou mulher de desistir. Aliás, gosto de chegar em primeiro. Não como essas mulheres que correm para chegarem primeiro na abertura dos saldos. Sou antes do tipo da cliente especial que é convidada para as promoções antes do fim de estação. Não há desespero aqui. Não levo a vida/o amor demasiado a sério. É antes uma insustentável leveza da existência que me anima.
No meu caso, que já passei os 40,reconheço no cavalheiro em questão os seus defeitos visíveis - tem um nariz demasiado adunco - e quanto aos ocultos, adivinhou: o tipo é mesmo poeta, com uma queda para a música (fruto de vidas anteriores)que manifesta com headphones ligados ao MP3 ouvindo a sua própria música, sem partilha. Porém, isto para mim não é defeito,antes me empolga neste clima de sedução. Para certo, e serial killer de emoções, já tenho um lá em casa que me entedia.
Matilde Beijaflor (juro que não sou brasileira)

OS CONSELHOS [ATRASADOS] DA DRA RUTH

Queridos leitores:

Venho hoje responder à carta de uma senhora desesperada. Uma senhora brasileira, embora não seja esse o único motivo do seu desespero.
A questão é que ela se apaixonou por um colega de serviço. Sentando-se, num almoço de Natal da sua empresa, diante do objecto de seu amor, percebeu que este não lhe ligava especialmente. Não é que a ignorasse. Ou que chegasse a entornar-lhe vinho para cima, servindo-a por educação enquanto mirava o decote de outra. É que as solicitações abundavam, e o gentil senhor mal sabia para onde se voltar.

Eu compreendo-a, boa amiga. Pelo que deduzo, na sua empresa, um jovem ainda apresentável, gentil, bem vestido, há-de ser caso raro, daí atrair o mulherio. E há que compreender: não vivemos tempos propícios à apresentação de homens apresentáveis. O género masculino anda por baixo. Desde há algum tempo. (Em Portugal, desde, sei lá, Dom Afonso Henriques). Pessoalmente, não consigo lembrar-me, de repente, de três amigos meus que não sejam carecas, ou gordos, ou obcecados pela bola e em mamas, ou bebedolas, ou tudo isso ao mesmo tempo. Aparece-lhe na empresa um sujeito cheio de charme, queria o quê?
Eu tenho um conselho para lhe dar, minha amiga. Pede-me um conselho para o conquistar? Dou-lhe um conselho: desista dele. E console-se com uma ideia: um homem tem de ter defeitos. Uma mulher poderá não os ter, mas um homem tem por força de os ter. Os defeitos da maioria são visíveis: mais vale ficarmo-nos por esses, porque quem não tem defeitos à vista, pode ter, secretamente, um dos piores. E se fosse um serial killer? Ou um poeta? Já viu bem..?

12 janeiro 2011

AS COMADRES

As comadres marcaram um chá com muitos bolinhos com o pretexto de trabalhar em conjunto, definir algumas estratégias de acção. Os dias passavam rápido e a vida social de uma das comadres não lhe deixava tempo de sobra para floreados. No entanto, ela adorava floreados e desconfiava que era por isso que até se entendiam as duas. Mas havia algum tempo que o trajar da outra comadre era discreto, tinha até abandonado os chapéus com floreados.
Uma das comadres mostrou o seu dossiê à outra enquanto adoçava o chá, com o orgulho estampado no rosto. Já ia no segundo volume e pretendia atingir sete antes de acabar o ano. Gostava de fazer floreados.
A outra comadre empalidecia a cada folha volvida e cantarolava baixinho com o olhar esgazeado... ai a minha vida...


Este dia a dia é duro
É duro de se levar
É de casa pró trabalho
E do trabalho pró lar

Ai a minha vida
Ai a minha vida

08 janeiro 2011

ESTOU TRISTE

Porque nunca podemos aceitar a morte mas devemos curvar-nos perante a sua inevitabilidade, estou triste. Acabo de saber que um homem que me fez exultar perante os seus textos, acabou de deixar o nosso mundo. Terá partido um grande homem, que tanto me inspirou; terá partido em busca de outros mundos quiçá mais calmos, mas onde de certeza lhe faltarão os temas preferidos da sua escrita.
Tive alguns ciúmes dele, devo confessar. Da sua língua viperina que me fez muitas fezes desejar ter a sua coragem. Não tanto do seu cabelo branco porque eu nunca ousaria deixar-me fotografar e muito menos aparecer em público sem retocar uma ou outra branca que teimosamente me vai contornando o rosto. Ah! ela fraquejou, pensarão. Não, queridos, Paula Thrombone nunca fraqueja. Paula Trombone é sincera tal como Carlos Castro o foi. Não teve foi a mesma projecção porque este blogue, convenhamos, não tem o impacto de uma Nova Gente ou de uma VIP. Essas revistas fazem furor nas secretárias das funcionárias desta escola que dedicam horas do seu tempo a folheá-las vezes sem conta, mesmo que sejam do ano passado. Algumas fazem até as palavas cruzadas, esse joguinhos pindéricos de praia que não aconselho a ninguém.
Queriduchas, oiçam com atenção: usem essas revistas como guias do bom trajar. Sigam exemplos, não inventem. Mas prefiram revistas deste ano. É que, a ver pelas vossas roupitas, as revistas que lêem já devem ter uns aninhos...
Deixo-vos a pensar nisto enquanto me recolho para meditar na calamidade que se abateu hoje sobre o nosso país.
Beijo-vos a todos, queridos, prometendo que em breve vos direi mais umas verdades.

06 janeiro 2011